Re-abrindo a discussão (parte 5 de ?)
Luís,
Eu comparo Filosofia com História porque acho que as duas são igualmente importantes numa "educação liberal". Eu nunca vi ninguém discutir se História deveria ou não ser ensino obrigatório no segundo grau. E eu não vejo porque com a Filosofia deveria ser diferente.
O ensino médio no Brasil não é que nem em outros países em que se tem matérias eletivas. É gradinha fechada para todo mundo. É claro que a discussão sobre grade fixa vs. eletivas é muito válida. A comemoração então não é tanto pela obrigatoriedade da Filosofia em si, mas sim pelo fato de ter sida elevada ao status de outras matérias de segundo grau como a História e a Matemática. É aquela alegria de quem finalmente deixou de dormir de favor num colchão na casa dos outros e passou a ter seu próprio espaço de fato e de direito.
Não que isso resolva todos os problemas do mundo. Mas é uma pequena vitória. Qual o mal de comemorar? A alegria, nem que seja com coisa tão pouca, me dá ânimo para tentar melhorar o que falta, o que não é pouco. Pode ser que só eu ache isso legal, e eu entendo muito bem os que não compartilham de meu otimismo. Acho que até o desânimo dos pessimistas eu entendo. Agora gastar energia com anti-otimismo ativo é uma coisa da qual eu não vejo a utilidade.
Necessário vs. ajuda pra caramba
Se ao invés da história ou da filosofia eu tivesse dito que a alfabetização é necessária para o exercício ativo da cidadania, talvez a explicação tivesse sido mais clara. É claro que alguém ainda poderia dizer que "existem vários analfabetos que exercem bem sua cidadania, que transformam a realidade, que fazem história".
Se isso então prova que alfabetização não é necessária para a participação ativa na sociedade, o fato ainda permanece que o não saber ler dificulta muitíssimo tal participação. Daí dizer que a alfabetização, senão necessária para o exercício ativo da cidadania, pelo menos ajuda pra caramba.
Mas eu ainda prefiro arredondar para cima e dizer que é necessária ponto. Dá um toque retórico mais dramático.
Mas o que é esse tal de "exercício ativo da cidadania", e o que que a filosofia, a alfabetização ou a educação tem a ver com isso?
No começo do "Ensaio sobre o Entendimento Humano", Hume usa a definição aristotélica do ser humano como animal racional e social para dizer que se um desses três aspectos (animal, racional, social) sobressai ou atrofia, a pessoa não está vivendo plenamente seu potencial humano.
Por exemplo, se o social sobressai tanto que não se tem tempo para filosofar, ou não comemos e dormimos direito, temos um desequilíbrio. Por outro lado, se a filosofia nos prende à poltrona e a gente se esquece do lado animal ou social, também temos um desequilíbrio. Da mesma maneira, se só comemos e dormimos, e nem estudamos nem nos relacionamos, mais um desequilíbrio.
Pode ser que Aristóteles estivesse errado quando disse que o ser humano é um animal político, ou Platão quando disse que a diferença entre indivíduo e estado é só questão de escala. Mas estas questões em si mesmas são filosóficas.
Não só isso. Decidir ser uma pessoa apolítica é em si mesmo uma decisão política, e qualquer debate desesa natureza é um debate tanto político como filosófico. E esse é o tipo de debate que alunos de segundo grau têm toda capacidade e direito de fazer.
E por que não encorajá-los, e dar a eles algumas ferramentas teóricas? Não acho que seja só professor de filosofia que ganha com isso. Todo mundo ganha.
Fim por enquanto. Mas não termina por aqui. Entre você também nesta discussão!
Que que você acha: filosofia tem alguma coisa a ver com cidadania ou não? É necessária, suficiente, ajuda pra caramba, ou não tem nada a ver? O ensino sendo do jeito que é, é melhor ficar sem?
Participe você também! Sua opinião é super importante.