Interplexa

Do Latim Estérico: Inter (prep. "entre") + plexa (particípio do verbo "plicare", "dobrar", "desdobrar", "laçar") Significado: 1. neutro plural:"Coisas entrelaçadas ou que se desdobram internacionalmente" 2. feminino singular: "Mulher (ou menina) de camadas interligadas ou que se desdobra internacionalmente) Vide também: www.internexa.blogspot.com

Minha foto
Nome:
Local: Brasília, Toronto

Brasiliense de origem montalvanense desbravando o gelado inverno do doutorado canadense.

22.4.07

Quatro meses

Segundo Sartre, 3 da tarde é cedo demais ou tarde de mais para fazer qualquer coisa que você queira fazer. Eu acho que o mesmo pode ser dito do período de quatro meses. Ou é tempo demais, ou não é tempo suficiente.

Por exemplo: eu vim para o Canadá para passar quatro meses. Daí eu gostei tanto que eu decidi ficar outros quatro. Eu depois mais quatro. E já tem oitos anos que eu estou nessa.Natal passado eu disse "chega". Eu ficaria mais quatro meses, e retornaria para o Brasil em abril. E por ser os "últimos" quatro meses, eu parei de experimentar coisas novas. Afinal, para que começar algo novo, para abandonar em quatro meses?

O curioso é que quando eu vim para o Canadá, eu usava a mesma justificativa para o comportamento oposto. Eu tinha que experimentar tudo, e rápido, porque eu só tinha quatro meses aqui. Sem tempo a perder. Então eu fiz amizades, e conheci lugares, e fiz coisas, e andava para cá e para lá sempre contente e satisfeita.

Mas enquanto os primeiros quatro meses no Canadá eram motivo de estar extremamente aberta, os últimos quatro meses viram o fenômeno contrário. De repente quatro meses era tempo de mais, mas não o suficiente para começar a fazer qualquer coisa que valha a pena fazer. O fato de ser inverno não ajudou muito. Mas mesmo assim. Têm milhões de coisas legais para se fazer em quatro meses invernais, como meu amigo Danilo que acabou de mudar para Montreal no Natal passado pode atestar (http://degelocanadense.blogspot.com).

Estamos no final de abril, e os quatro meses foram de novo prolongado por mais quatro. Será tempo de mais ou de menos para fazer o que eu quero fazer agora?

Minha resposta desta vez: é o tempo certinho.

17.4.07

Resoluções de Meados de Abril

1. Parar de ler, até eu terminar de escrever minha tese.

2. Almejar escrever uma frase de cada vez, ao invés de esperar a página se encher de uma vez. Ou a tese inteira se escrever sozinha.

3. Pensar pelo menos 5 pensamentos impossíveis antes do café da manhã, à la Alice no País das Maravilhas.

4. Colocar pelo menos um deles no papel. De preferência em estilo ficção. Mas talvez em estilo tese também.

5. Parar de reclamar, a não ser que seja por escrito. De preferência em estilo de ficção. Ou poesia.

6. Passar na academia antes dos compromissos acadêmicos do dia.

7. Parar de querer analisar tudo, a não ser que seja por escrito.

8. Praticar falar com outras pessoas ao vivo e a cores de vez em quando, mas não sobre as coisas que eu destinei para o papel.

9. Ser menos econômica com minha câmera. Baixar o padrão de valor fotográfico das coisas.

10. Ser menos econômica com sorrisos. Sorrir de coisa à toa. E escrever sobre coisa à toa também.

11.4.07

Compromisso vs. passatempo

Semana passada vieram jantar na minha casa quatro colegas do meu departamento. Coincidência ou não, as quatro são chinesas, casadas, e os maridos (e filhos) continuam morando na China.

O que me fez pensar: às vezes eu reclamo das dificuldades de ralando com um doutorado sozinha, a oito mil quilômetros do resto da minha família, que essa vida dupla não vale a pena, para que que eu estou fazendo isso etc, etc. Mas para essas colegas, a vida dupla é muito mais acentuada, os vínculos familiares mais fortes, a viagem mais longa, barreiras lingüísticas e culturais muito mais pronunciadas.

E pode ser só impressão minha, mas elas parecem levar não só o doutorado com mais seriedade, mas todo o processo, com muito mais serenidade. É sacríficio? Com certeza, mas para elas é um sacrifício cuidadosamente escolhido. Elas têm um objetivo que faz todo essa estudação fazer sentido e ter um valor que vai além de estudar por estudar.

E eu, tenho algum objetivo? Não sei. Às vezes eu acho que tudo isso é que nem um grande joguinho de computador que eu comecei por achar divertido, mas que agora ficou difícil. E minha vaidade intelectual não me deixa largar por eu estar tão perto de zerar (quão perto, não sei). E não sei você, mas para mim isso não parece um motivo merecedor de doutorado.

Vai ver que descobrir um motivo mais valioso é justamente a chave que eu preciso para passar de fase.

9.4.07

Alimento para a Alma

Ontem eu fui almoçar num lugar que há tempos eu não freqüentava. Teve uma época que eu ia lá quase todo domingo, em parte porque eles sempre tocavam discos dos Beatles. Dicos inteiros. Do começo ao fim.

Desta vez não era os Beatles que temperavam o ambiente, mas Elvis Presley. Nada mal, embora isso dificultasse o processo de prestar atenção nas minhas conversas (quando elas existiam -- as distrações eram muitas). Depois do Elvis, veio uma salada de músicas dos anos 50 e 60, que fez não só eu, mas o pessoal da mesa do lado cantar.

Saindo do restaurante, entrei numa livraria em busca de inspiração. A inspiração veio, mas não tanto dos milhares e milhares de títulos tentadores, todos prometendo a solução para todos meus problemas (tenho certeza que a solução está lá em algum lugar, só que meu tempo de vida é limitado, e o número de livros no mundo - ou nas livrarias - parece não ser).

A inspiração veio pelos auto-falantes: eles tocavam "Help", dos Beatles. E não se limitaram à primeira faixa do disco de mesmo nome (que por si só refletia bem meu estado de espírito e ironicamente o deixava mais leve). Eles tocaram o disco inteiro. Todas as quatorze faixas.

Como meu pobre irmão bem sabe,"Help" foi o primeiro disco que eu comprei, com minha própria mesada. Com a costumeira avidez de adolescente, eu pus esse disco para tocar até ele (o disco, não meu irmão) quase furar (o disco era de vinil, e a mesada limitava um pouco o repertório). Eu diria quase que eu escutei este disco "ad nauseam", só que eu nunca enjoei dele (não sei se meu irmão pode dizer o mesmo). Eu decorei as letras todas (apesar de não saber inglês na época, o que nunca foi empecilho). Aprendi os acordes todos (duas coisas na minha vida que começou com os Beatles: inglês e violão). E agora na livraria, muitas mesadas depois, eu não conseguia de jeito nenhum lembrar a última vez que eu tinha ouvido esse disco.

Eu não estava procurando nada específico na livraria (além do significado da vida, do universo e de tudo que existe -- como eu estava dizendo, nada específico). Então fiquei andando sem rumo de prateleira em prateleira. Percorri as estantes todas, de "Antropologia" a "Zoologia", passando por "Saúde e Bem-Estar" e voltando via "Estilo de Vida Digital", cantarolando, digo, cantando em alta voz, pronunciando deliberadamente cada palavra, lembrando da época que eu não sabia o que elas queriam dizer, mas as dizia saborosamente. Algumas pessoas por quem eu passava olhavam para mim confusas. Algumas outras estavam compenetradas demais em suas buscas, e enquanto outras estavam compenetradas cantando também (principalmente durante "Yesterday", durante "Act Naturally" nem tanto.)

No último acorde de "Dizzy Miss Lizzy", minha busca por inspiração se deu por terminada. Voltei para casa, completamente satisfeita com meu especial de domingo: almoço e livraria. E até agora eu não sei dizer se o que repunha minhas energias naquele restaurante era a comida ou se era a música.