Interplexa

Do Latim Estérico: Inter (prep. "entre") + plexa (particípio do verbo "plicare", "dobrar", "desdobrar", "laçar") Significado: 1. neutro plural:"Coisas entrelaçadas ou que se desdobram internacionalmente" 2. feminino singular: "Mulher (ou menina) de camadas interligadas ou que se desdobra internacionalmente) Vide também: www.internexa.blogspot.com

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Local: Brasília, Toronto

Brasiliense de origem montalvanense desbravando o gelado inverno do doutorado canadense.

19.7.07

Respingos de uma tempestade

Estando fora do Brasil, a gente só ouve os respingos das notícias, ainda mais eu que sou meio alheia a noticiários. Mas a notícia do acidente com o avião da TAM me abalou muito ontem. Na verdade, não consegui concentrar em mais nada o dia todo, toda hora parando para ver se tinha mais notícia online.

O que me impressiona mais talvez é a proximidade da coisa. Eu tinha passado boa parte do dia anterior, digo, do mês, do ano, pensando na logística da minha mudança para Brasília em agosto. Toda vez que eu vou, tenho que trocar de avião em São Paulo, às vezes tenho que trocar até de aeroporto, de Guarulhos pra Congonhas e vice-versa. Dessa vez eu tenho algumas coisas a resolver em São Paulo, e estou que calculo se é melhor resolver essas coisas logo nessa parada em São Paulo antes de seguir para Brasília, ou se com a mudança toda é melhor seguir logo e voltar a São Paulo depois na primeira oportunidade.

Então eu estou que penso nesse esquema tem tempo. Mas nessa semana um detalhe tornou toda essa logística de passar por São Paulo ainda mais complexa. Uma colega minha aqui de Toronto gostaria que eu fosse com ela para Porto Alegre, para dar uma ajuda com a pesquisa dela. Dois dias atrás estávamos tentando decidir se vale mais a pena fazer emendar essa viagem logo com minha ida em agosto, ou se e melhor fazer uma viagem separada em outubro. Dois dias atrás estávamos fazendo esses planos todos. Depois disso, não falei mais com ela, e não sei a quantas andam os planos dela agora. Mas com certeza de lá para cá muita coisa mudou: muita coisa que não tinha como a gente ter colocado nos nossos planos. Ou nos planos de ninguém.

No natal passado, a última vez que estive no Brasil, os efeitos do acidente do avião da Gol ocorrido em setembro ainda estavam bem visíveis e palpáveis (vide meu post de 5 de janeiro). Este tinha sido o maior acidente aéreo do Brasil até então. Uma tia minha trabalha no aeroporto de Brasília, e colegas dela tinham morrido no acidente. Outros teriam morrido também, se não tivessem mudado de vôo na última hora. Ela tinha fotos dos colegas que morreram, e relatos dos que sobreviveram. E de repente, ver os rostos de dois das dezenas de passageiros que morreram me fez sentir a intensidade e proximidade da coisa.

Mas esse é um lado só. Mas as repercussões no trabalho de outros familiares, entre jornalistas, policiais, funcionários públicos: tinha repercussões para todos os lados.

E isso eram repercussões de um acidente que tinha ocorrido meses antes no meio da floresta Amazônica. O acidente dessa semana foi bem no meio da maior cidade da América do Sul, menos de um ano depois do outro acidente. Imagino que as repercussões devem estar nas alturas. Só dos respingos que chegam até aqui, eu já me arrepio.

E os arrepios não é só pela proximidade da coisa, apesar desse fator pesar muito. É estranho pensar "Caramba, isso poderia ter acontecido comigo." Mas poderia. Eu já aterrissei várias vezes em Congonhas, algumas delas em tempo chuvoso, e provavelmente terei essa oportunidade outras vezes.

Mas além da proximidade, tem a magnitude de um acidente desse porte, do número de pessoas e de atividades que ele afeta direta ou indiretamente. É algo assim de dar dor de cabeça só de pensar. Eu penso na família de cada uma das duzentas e tantas pessoas, e no que elas deve estar pensando e sentindo, e como a vida delas mudou de repente. E penso nas pessoas que estavam no prédio que foi atingido, e no posto. Penso nos carros que viram um avião passar de raspando e escaparam por um fio. E no que deve ter passado na cabeça não só dos passageiros do avião, mas do piloto, e dos comissários de bordo. Penso nas pessoas que trabalham no aeroporto, ou nos arredores, ou em qualquer aeroporto ou avião. E nas pessoas que trabalham com elas ou para elas. E nas pessoas que moram com elas, ou que as conhecem. É muita gente. É muita coisa. É muito forte.

É inimaginável, indescritível. Faz qualquer coisa que eu daqui possa dizer ou sentir micro-fichinha em comparação: respingo do respingo do respingo da tempestade. Então vou parar por aqui, com um breve momento de respeitoso silêncio.