Interplexa

Do Latim Estérico: Inter (prep. "entre") + plexa (particípio do verbo "plicare", "dobrar", "desdobrar", "laçar") Significado: 1. neutro plural:"Coisas entrelaçadas ou que se desdobram internacionalmente" 2. feminino singular: "Mulher (ou menina) de camadas interligadas ou que se desdobra internacionalmente) Vide também: www.internexa.blogspot.com

Minha foto
Nome:
Local: Brasília, Toronto

Brasiliense de origem montalvanense desbravando o gelado inverno do doutorado canadense.

22.9.07

Fase Nova, Blog Novo

Pessoas,

Para marcar um nova fase da minha vida escolar, decidi hoje criar um novo blog. Ou dois. Os nomes são mais auto-explicativos do que os descolados interplexa e internexa:

- blogdaester.wordpress.com é o novo blog em português. Todos os arquivos do interplexa foram passados para lá

- estersblog.wordpress.com por sua vez é o novo blog inglês, armazenando todos os antigos posts da história do internexa.

Fácil, não? Eu achei super-fácil.

"Mas, Ester, por que você resolveu mudar de blog, se o seu já era tão legal?"

Seguinte: por mais que o interplexa fosse muito legal, e eu tenha aprendido muito com o blogspot, na hora de colocar um tanto de fotografia as coisas ficavam complicadas. Minha amiga Alexandra, que gosta muito de postar suas fotos e vídeos, há muito havia me indicado o wordpress. Ela tinha me dito que era mais fácil de usar, mas eu não tinha idéia que era assim tão mais fácil. Até hoje.

Não vou falar mal do blogspot porque devo muito a ele. Mas eu tinha planejado para hoje um post cheio de foto de novo (Com o sugestivo título de "Umidade 11%). Todavia, só de pensar na trabalheira do último post, me bateu um desânimo... Resolvi então dar uma olhada no wordpress. Gamei.

Então é isso. Vejo vocês por lá.

Beijos e queijos,

Ester
*****

21.9.07

Primavera em Brasília

Como alguns de vocês sabem, estou passando essa primavera em Brasília. E como este fim de semana marca oficialmente o início da primavera, eis aqui um relatório oficial da minha nova rotina diária.


Primeiro, acordo e olho pela janela:







Tomo um café esperto, e parto para a biblioteca da universidade:







Estaciono e, andando, penso nos meus compromissos do dia:






Chego à biblioteca, e trabalho a manhã toda:



Volto para casa para almoçar:





À tarde, vou para a biblioteca da paróquia:




É fim de dia e de inverno na capital federal.

15.9.07

Post Mortem (parte 2 de 2)

No post passado, eu falei de dois cantores geniais que morreram de forma chocante ainda muito novos: John Lennon e Cazuza. Mas o que me levou mesmo a ressucitar este blog foi o especial da Globo sobre o Renato Russo, que foi ao ar na última sexta-feira. O impacto do programa em mim foi tão grande que eu passei o final de semana inteiro na maior deprê. "Pô, cara, o Renato Russo morreu. Que tristeza."

Quando o Renato Russo morreu em 1996, eu tinha 16 anos e tinha acabado de transferir para uma escola nova. Era a Semana Cultural no Centro Educacional Sigma, e o número de bandas fazendo cover do(a) Legião Urbana era algo absurdo -- isso antes mesmo de sair a notícia que o Renato tinha morrido.

Legião Urbana era para mim outro caso clássico de música de clube. Fan eu não era; na verdade, nem me dava conta que eu sabia tanta música deles. Quando a notícia estorou na mídia, foi aquela overdose: Legião tocando em todo lugar, fanatismo total. Até porque mais ou menos na mesma época saiu o "Tempestade", que o Renato tinha gravado três meses antes de morrer, e a procura por esse disco foi uma febre. Eu não conseguia entender muito o chororô geral -- falar a verdade, estava até um pouco de saco cheio.

Mas foi justamente aí que eu percebi que osmose ou não, o número de músicas do Legião que eu sabia de cor -- sem nem saber que era Legião -- era imenso. Até os longos 9 minutos e pouco de Faroeste Caboclo eu tinha na minha memória, da época que eu e meus primos ficávamos competindo, nas tardes de sábado no clube, quando eu tinha lá meus 7 anos.

Sem muito alarde, até para não pagar muito a língua, fui comprando um disco aqui, outro ali, até adquirir a coleçao completa. Legião virou algo central no meu repertório de violão, ao lado dos Beatles. No princípio, eu gostava mais das músicas da época do clube -- anos 80, coisa de início de carreira. Depois vieram o disco V e o Descobrimento do Brasil, coisa já da minha adolescência. Daí o discos solo. (Se alguém duvida do efeito dessas músicas no meu consciente-inconsciente-subconsciente e super-consciente, vide este post de agosto passado.)

Me impressionava não só a poesia e o poder de observação das letras do Renato Russo, como o bom gosto dele nos covers que ele escolhia. Por bom gosto entenda-se: gosto que nem o meu. Madonna, Billy Joel, Neil Young: só tem coisa boa. Para ter idéia, há alguns meses eu falei da minha recente descoberta e fascínio com a música do Leonard Cohen. Até hoje eu tenho que escutar esse disco pelo menos umas dez vezes por semana (dia sim, dia não, com direito a um repeat ou dois). Qual então não foi minha surpresa semana passada ao escutar pela primeira vez o disco "Último Solo" do Renato Russo e dar de cara logo na primeira faixa com o "That´s no way to say good-bye" do Leonard Cohen. Foi dar de cara e ficar de cara.

Pensando bem, acho que o que eu gosto no Renato Russo e no Leonard Cohen é bem parecido: uma poesia inteligente combinada com uma percepção aguda do dia-a-dia. É o tipo de coisa que me faz gostar também do Raul Seixas e do Belchior.

(parêntese 1: por algum motivo muito interessante a wikipedia em inglês coloca Cazuza, Mutantes, Raul Seixas e Renato Russo como grandes nomes da música nacional. Não sei quem fez essa seleção, mas que tem um super bom gosto, isso tem.)

(parêntese 2: O Raul é outro desses caras que eu sei de cor e salteado por osmose, que morreu novo em 1989, que eu admiro muito hoje mas que cuja biografia eu conheço pouco. No dia que sair um especial sobre o Raul, aposto que eu vou ficar tão impressionada como fiquei com os tributos a John Lennon, Cazuza, e Renato Russo que citei nestes dois posts-mortes).

Mas eu divago. O que eu queria dizer é que eu passei o final de semana pensando no Renato Russo, e querendo saber mais sobre a vida dele. Só de re-escutar a discografia completa no sábado (sim, tive que escutar ela todinha. Várias vezes), desta vez sabendo que quando ele escreveu tal música, ele sabia que estava morrendo. Quando escreveu essa aqui, ainda não. Quando escreveu essa ele tinha acabado de assinar o primeiro contrato de gravação e cortado os pulsos. Só de saber um pouquinho da história por trás de uma música aqui outra ali me fez encher de lágrima.

Mas acho que o que de tudo de tudo me deixou mas impressionada foi que ele morreu sozinho. Nem a mãe dele, nem o pessoal do Legião sabia que ele tinha AIDS, ou pelo menos foi o que o programa da Globo deu a entender. Pelos meus cálculos, o Renato ficou sabendo que era aidético mais ou menos na época que o Cazuza morreu. Talvez ele tenha ficado impressionado com a cobertura minuto a minuto da doença do Cazuza, e resolveu partir para o outro extremo. Não sei. Mas só de imaginar a situação toda, dele segurar sozinho essa barra, me dá um aperto no coração.

O que no final das contas prova que apesar de todo meu complexo de superioridade, minhas emoções são tão vulneráveis a estímulos midiáticos como a de todos os tietes que na minha ignorância eu criticava. Se brincar, até mais. Porque olha só: até sair para comprar a biografia do Renato Russo eu saí. Se todo mundo que tem o meu poder aquisitivo é tão influenciável quanto eu, estimo que as vendas do "Trovador Solitário" neste final de semana deve ter batido recorde. Se não bateu, isso só pode provar que meu nível de impressionabilidade é maior do que a média da população que tem meu nível de renda ou maior. Não falei que tinha complexo de superioridade?

Enfim, vou parar por aqui e ir devorar meu livrinho novo. Depois eu conto detalhes. E depois do fim, o que vier vai terminar de ser o começo:

É tão estranho
Os bons morrem jovens
Assim parece ser
Quando me me lembro de você
Que acabou indo embora
Cedo demais

(Renato Russo, Love in the Afternoon)

Post Mortem (parte 1 de 2)

É tão estranho
Os bons morrem antes
Me lembro de você
E de tanta gente que se foi
Cedo demais

(Renato Russo, Love in the Afternoon)

Quando o John Lennon morreu, eu tinha acabado de comemorar meu primeiro aniversário. A primeira vez que eu lembro de ter ouvido o nome do ex-Beatle -- ou dos Beatles -- foi em dezembro de 1990, quando passou na TV o filme "John e Yoko" e o show "Tributo a John Lennon", para comemorar os dez anos de seu assassinato.

Eu tinha onze anos, e fiquei impressionada. Tínhamos acabado de comprar nosso primeiro video-cassete, e uma das primeiras fitas que a gente gravou continha esses dois programas. Em um mês eu devo ter assistido essa fita umas dez vezes, possivelmente mais. Como se isso não fosse suficiente, já que eu e meu irmão acabamos decorando os diálogos, nós às vezes dispensávamos a fita e fazíamos a dramatização ali nós dois, colocando um primo como terceiro figurante quando dava. Por algum motivo, o cara que dublava o John Lennon parecia ser o mesmo que dublava o Chapolin, o que deixava as cenas ainda mais memoráveis, e fazia a gente cair na gargalhada sem nem saber por quê. Os efeitos dessa maratona foram permanentes; quem duvidar, dê uma olhada neste meu post de abril, ou neste testemunho do meu irmão caçula.

Isso foi em dezembro de 1990. Em julho do mesmo ano morreu Cazuza. A gente estava de férias, e tínhamos parado em Três Marias no meio de uma viagem de carro Brasília-Rio. A notícia não pegou ninguém de surpresa-- acho que a minha surpresa foi de saber que ele até o dia anterior ele ainda estava vivo. O Cazuza foi a primeira personalidade brasileira a assumir publicamente que era portador do vírus da AIDS, e a evolução da sua doença foi exaustivamente documentada pela mídia da época.

Apesar de não ser fan do Cazuza na época (não sei se eu era fan de alguma pessoa na época, talvez do Balão Mágico), eu conhecia muita música dele por osmose. Muita mesmo. Cazuza é o que até hoje eu defino como "música de clube": era o que tocava nas rádios na época em que passávamos as tardes de sábado no clube nadando ou brincando de bola. Como esse era o único lugar que eu ouvia rádio na época -- por que os alto-falantes eram tão altos e onipresentes a não dar outra opção -- e como Cazuza era o que estava nas paradas do rádio, ergo Cazuza tornou-se um caso clássico de música de clube, ao menos para mim.

Mas assim, eu nunca pensei muito no Cazuza. Quer dizer, até o ano passado, quando assisti o filme baseado em sua vida. Daí lá foi Ester de novo ficar super-impressionada. Em um mês, eu devo ter visto o filme umas quatro ou cinco vezes. Comprei uns três discos, e pus para tocar o que eu já tinha e nunca havia parado para escutar muito. Por mais de mês não tocava mais nada no meu som. Virei fan de carteirinha. O cara é muito gênio, fala sério.

----
Não perca no próximo episódio: Renato Russo e o "Por Toda Minha Vida" de 14 de setembro.

30.7.07

Verdes: planta e sentimento

Há não muito tempo eu postei uma história - poderíamos até dizer uma confissão - contando minhas aventuras com uma planta que uma colega me pediu para tomar conta na sua ausência. A todos que expressaram preocupação, é meu prazer informar que a plantinha vai bem, obrigada. Aliás, super bem: ao chegar ao trabalho hoje, para minha grande surpresa, eu descobri que a plantinha tinha produzido dúzias de folhinhas no final de semana! Eu nunca tinha visto mais de três ou quatro de uma vez.
Vamos aos fatos:

Fato número 1: Eu rego "minha" plantinha toda segunda-feira, esvaziando metade de uma garrafa plástica de 250ml. Até segunda-feira passada, o conteúdo da garrafa consistia puramente em 100% água da torneira.

Fato número 2: Quando a planta estava à beira da morte, alguns amigos me recomendaram experimentar colocar um pouco de fertilizante. Mas como eu não sabia onde comprar tal produto, e no que eu pensava, a planta parou de morrer, tal compra meio que perdeu a urgência.

Fato número 3: Até que na sexta sem ser essa passada a outra, uma floricultura apareceu no meu caminho. Resolvi perguntar se tinha alguma coisa genérica e, o mais importante, fácil de usar (a idéia de manusear adubo não me apetecia muito). Depois de me perguntar um tanto de pergunta sobre a plantinha (as perguntas mais difíceis!) , o cara me apresentou um vidrinho, cujo rótulo dizia:

"Liquid Plant Food"
7 gotas por litro de água
Toda vez que você regar, tudo vai crescer!
Agora com aplicador prático!

Justamente o que preciso, pensei comigo. E apesar de todo meu ceticismo urbano, pela reles quantia de $6,99 eu comprei 118ml deste fantástico elixir (com conta-gotas e tudo!) e fui para casa.

Fato número 4: 7 dividido por 2 é igual a 3,5. A capacidade da minha garrafinha plástica, como disse, é de 250ml, ou seja, um quarto de litro. Portanto tenho que dividir 3,5 por 2 de novo para saber quantas gotas do produto devo colocar na garrafinha. Meus talentos aritméticos prontamente me deram a resposta: 1,75 gota (ou gotas) por litro.

Apesar de meus talentos lingüistícos hesitarem se o número 1,75 requer singular ou plural, minha contabilidade filosófica não titubeou em concluir que isso equivalia aproximadamente a uma gotona mais uma gotinha menor. Utilizando meu prático aplicador, lá foi pingão, seguido de pinguinho. Depois foi só tampar (detalhe importante), agitar bem, e pronto.

Fato número 5: Daí há exatamente uma semana, eu molhei meticulosamente a terra da plantinha, despejando metade da poção obtida através do processo descrito no No. 4 acima (a outra metade eu deixei para usar hoje).

Fato número 6: O resto da história o leitor atento já sabe: eu chego no escritório hoje e a plantinha está cheia de folhinhas-nenéns. Isso sem nenhum manuseio de adubo! Meu ceticismo urbano foi arrancado pela raiz.

Conclusão: Agora eu entendo porque que jardineiros e fazendeiros se orgulham tanto de suas produções: o cuidado que elas requerem acabam deixando a gente super coruja. Aliás, quer ver que gracinha os meus nenéns? Olha só:


Foto 1: A poção. Parece que estou fazendo comercial do produto, não?
Note bem o raminho lampeiro posando para a foto com suas três folhinhas recém-nascidas.

Foto 2: Zoom no raminho lampeiro. Está vendo as três folhinhas que lindas?



Foto 3: Close numa das folhinhas. Um charme, não?

(Nota: nenhuma folhina foi mal-tratada ou sufocada na produção desta foto.)


Foto 4: E todo ramo tem suas folhinhas caçulas! Ester está toda orgulhosa!


19.7.07

Respingos de uma tempestade

Estando fora do Brasil, a gente só ouve os respingos das notícias, ainda mais eu que sou meio alheia a noticiários. Mas a notícia do acidente com o avião da TAM me abalou muito ontem. Na verdade, não consegui concentrar em mais nada o dia todo, toda hora parando para ver se tinha mais notícia online.

O que me impressiona mais talvez é a proximidade da coisa. Eu tinha passado boa parte do dia anterior, digo, do mês, do ano, pensando na logística da minha mudança para Brasília em agosto. Toda vez que eu vou, tenho que trocar de avião em São Paulo, às vezes tenho que trocar até de aeroporto, de Guarulhos pra Congonhas e vice-versa. Dessa vez eu tenho algumas coisas a resolver em São Paulo, e estou que calculo se é melhor resolver essas coisas logo nessa parada em São Paulo antes de seguir para Brasília, ou se com a mudança toda é melhor seguir logo e voltar a São Paulo depois na primeira oportunidade.

Então eu estou que penso nesse esquema tem tempo. Mas nessa semana um detalhe tornou toda essa logística de passar por São Paulo ainda mais complexa. Uma colega minha aqui de Toronto gostaria que eu fosse com ela para Porto Alegre, para dar uma ajuda com a pesquisa dela. Dois dias atrás estávamos tentando decidir se vale mais a pena fazer emendar essa viagem logo com minha ida em agosto, ou se e melhor fazer uma viagem separada em outubro. Dois dias atrás estávamos fazendo esses planos todos. Depois disso, não falei mais com ela, e não sei a quantas andam os planos dela agora. Mas com certeza de lá para cá muita coisa mudou: muita coisa que não tinha como a gente ter colocado nos nossos planos. Ou nos planos de ninguém.

No natal passado, a última vez que estive no Brasil, os efeitos do acidente do avião da Gol ocorrido em setembro ainda estavam bem visíveis e palpáveis (vide meu post de 5 de janeiro). Este tinha sido o maior acidente aéreo do Brasil até então. Uma tia minha trabalha no aeroporto de Brasília, e colegas dela tinham morrido no acidente. Outros teriam morrido também, se não tivessem mudado de vôo na última hora. Ela tinha fotos dos colegas que morreram, e relatos dos que sobreviveram. E de repente, ver os rostos de dois das dezenas de passageiros que morreram me fez sentir a intensidade e proximidade da coisa.

Mas esse é um lado só. Mas as repercussões no trabalho de outros familiares, entre jornalistas, policiais, funcionários públicos: tinha repercussões para todos os lados.

E isso eram repercussões de um acidente que tinha ocorrido meses antes no meio da floresta Amazônica. O acidente dessa semana foi bem no meio da maior cidade da América do Sul, menos de um ano depois do outro acidente. Imagino que as repercussões devem estar nas alturas. Só dos respingos que chegam até aqui, eu já me arrepio.

E os arrepios não é só pela proximidade da coisa, apesar desse fator pesar muito. É estranho pensar "Caramba, isso poderia ter acontecido comigo." Mas poderia. Eu já aterrissei várias vezes em Congonhas, algumas delas em tempo chuvoso, e provavelmente terei essa oportunidade outras vezes.

Mas além da proximidade, tem a magnitude de um acidente desse porte, do número de pessoas e de atividades que ele afeta direta ou indiretamente. É algo assim de dar dor de cabeça só de pensar. Eu penso na família de cada uma das duzentas e tantas pessoas, e no que elas deve estar pensando e sentindo, e como a vida delas mudou de repente. E penso nas pessoas que estavam no prédio que foi atingido, e no posto. Penso nos carros que viram um avião passar de raspando e escaparam por um fio. E no que deve ter passado na cabeça não só dos passageiros do avião, mas do piloto, e dos comissários de bordo. Penso nas pessoas que trabalham no aeroporto, ou nos arredores, ou em qualquer aeroporto ou avião. E nas pessoas que trabalham com elas ou para elas. E nas pessoas que moram com elas, ou que as conhecem. É muita gente. É muita coisa. É muito forte.

É inimaginável, indescritível. Faz qualquer coisa que eu daqui possa dizer ou sentir micro-fichinha em comparação: respingo do respingo do respingo da tempestade. Então vou parar por aqui, com um breve momento de respeitoso silêncio.

12.7.07

Pessoa Física

Uns dois meses atrás eu me dei conta que eu tinha esquecido de informar ao Ministério da Fazenda que eu estava isenta de declarar meu imposto de renda, porque eu não tinha tido nenhuma renda. Tal esquecimento fez com que meu CPF se tornasse irregular, e agora eu tinha que regularizá-lo de novo.

Então fiz minha visitinha anual ao site da Receita. Mas dessa vez foi diferente. Bem diferente. O site tinha sido todo refeito, e eu não conseguia achar o lugar de regularizar o CPF. Na verdade, não é que o site tinha sido refeito: eles ainda estavam refazendo. E não é que eu não conseguia achar o link: achar eu achava, só que não chegava a lugar nenhum...

Me restavam três opções: 1) ligar para um número 0800; 2) fazer o pedido pessoalmente; 3) deixar pra lá. Opção número 1 estava fora de questão: a combinação 0800 + DDI não dá certo. Opção número 2 também não era muito prática. A não ser que eu fosse ao consulado, ou mandasse uma procuração para alguém. Então eu escolhi a opção número 3, e não fiz nada por uns dois meses.

Até que ontem, do nada, eu lembrei que eu tinha que fazer isso, e resolvi tomar vergonha na cara e ir ao consulado. Eu lembrava que o horário do consulado era bem restrito: das 10 às 14 horas. Eu trabalho das 10 às 16. Mas tenho uma hora de almoço. E o consulado só fica a uma 15 minutos do trabalho.

Então ontem, depois do almoço, eu corri para o consulado. Cheguei lá, descobri que na verdade o horário era de 9 às 13. Mas dessa vez eu decidi não me dar por vencida: resolvi que estaria lá assim que o consulado abrisse. Hoje de manhã, eu tomei meu banho, engoli meu café rapidinho, e pedalei até o consulado. Cheguei lá, fila única, três guichês, um cara chato sozinho atendendo (o cara chato eu já conhecia da vez em que eles perderam meus diplomas de graduação e mestrado. E também da vez em que ele tentou me convencer a não transferir meu título de eleitor para cá, porque dava muito trabalho, e que diferença um voto a mais ou a menos faz).

Lá pelas tantas, o cara chato (usarei a abreviação "CC" para me referir a ele daqui em diante) termina de "atender" as pessoas que ele estava atendendo, e grita: "Próximo!" A próxima na fila era uma senhora elegantemente vestida com um tailleur tamanho GG, que precisava de um visto de negócios para ir para os jogos panamericanos. O CC manda a dona GG para o outro balcão, porque o atendimento de vistos é só lá.

O próximo na fila é um senhor de idade, que também precisa de um visto para ir para o Pan. O CC muito pouco educadamente manda também o senhor de idade para o balcão fantasma, onde a dona GG pacientemente ainda aguarda atendimento. O CC então, no que pode ser interpretado como uma esforço para ser útil e/ou prestativo, vira o olhar para o teto, e grita em plenos pulmões: "tem gente no balcão de visto! Dá pra alguém ver se ajuda? (Meu palpite é que girar a cabeça num ângulo de 90 graus em direção ao interior do consulado é querer demais do seu CC: olhar para cima já é muita prestatividade).

A próxima na fila era uma morena à la Ivete Sangalo, bem alta com seus saltos agulha, linda, leve e solta com seu vestido de verão. Ela informa CC que precisa de um visto de negócios para os jogos panamericanos. O CC arregala os olhos e esquece de fechar a mandíbula por alguns segundos. "Que tipo de esporte você pratica?", pergunta ele muito amigavelmente.

A dona Ivete secamente responde que não é para ela, mas para a chefe que vai ajudar com a organização dos jogos. Todos nós na sala de espera temos então o prazer de descobrir que CC trabalhou por muitos anos no comitê Paraolímpico, e que ele tem muito interesse na parte organizacional de qualquer evento esportivo. Muito atencioso, ele pede os papéis da dona Ivete, para ver se não falta nada, para que ela não tenha que perder tempo na fila do outro balcão.

Nessa altura do campeonato, ficou claro a todos que, ao contrário do seu CC, a senhora GG dava conta de girar o pescoço mais de 90 graus. O senhor de idade então, chegava quase nos 180. A dona Ivete ficou sem graça, recusou educadamente a ajuda, e passou modestamente para a fila dos vistos, onde finalmente apareceu alguém para atender, e todos os pescoços voltaram à uma posição anatomicamente mais adequada.

A próxima pessoa na fila do CC era eu. Ele disse que eu queria fazer era muito trabalho (trabalho para quem?): que o consulado fazia só o papel de correios, e que, ainda assim, não dava nem para garantir que os documentos iam chegar no lugar certo. O melhor mesmo era achar alguém que estivesse indo para o Brasil, e passar uma procuração.

Outra opção seria fazer o requerimento via internet: e ele me deu uma folha de papel com o site da Receita Federal: aquele mesmo que não tinha solucionado meus problemas antes. Com esse papel na mão, eu saí do consulado, e cheguei no trabalho faltando 5 minutos para o expediente. Resolvi dar uma olhada no site. Acabou que o 0800 não é mais um 0800. E que dá para ligar via Skype. E que dá até para digitar os 11 dígitos do CPF no Skype, e os 8 dígitos da data de nascimento (dia, mês e ano). Para minha alegria, a tia da gravação disse que meu pedido tinha sido processado com sucesso, e que transcorridas 24 horas eu poderia acessar o site para ver a situação do meu CPF.

Problema resolvido, com um minuto inteirinho de sobra antes de começar meu expediente. Daí eu fico pensando: pra que simplificar se podemos complicar?

6.7.07

Contabilidade Filosófica

Ester numa entrevista de emprego...

"Devido a cortes no orçamento, minha graduação juntou dois cursos. Felizmente, parece existir uma demanda crescente no campo da contabilidade filosófica."

Tem anos que eu recortei essa tirinha e carrego ela comigo. Ela já me serviu em várias aulas de Filosofia da Educação. Já passou um tempão alfinetada no meu quadro de cortiça. Agora ela esta grudada com durex na porta do meu escritório, pelo simples fato de eu achar que ela descreve precisamente e concisamente minhas qualificações para meu trabalho atual.

Como eu disse no post "Primeiro de Maio", meu trabalho de verão é muito simples: oferecer quartos na universidade para viajantes que vêm a Toronto no verão. Alguns dos nossos hóspedes são estudantes, outros não. Alguns só passam a noite, outros ficam uma ou duas semanas, outros um ou dois meses, outros o verão inteiro. Alguns vêm do outro lado do mundo, outros do outro lado da cidade.

É uma mistura muito interessante, e eu aproveito a oportunidade para praticar minha comunicação interpessoal -- algo que meu trabalho acadêmico não exercita muito. E pode acreditar que nesse meu ramo de prestação de serviço a oportunidade é muita, tanto em quantidade quanto na variedade de interações.

O sistema de reserva que usamos provavelmente tem sido o mesmo nos últimos quarenta anos, senão mais. Ele consiste em dois fichários: o fichário de quartos (preto) e o fichário de pessoas (azul). Minha função é manter os dois fichários sincronizados o tempo todo

O fichário de quartos contém 20 folhas de papel quadriculado, de uns 30X45 cm. O eixo vertical (30cm) corresponde aos quartos. O eixo horizontal (45cm) marca os dias do mês. Cada folha descreve o que acontece em cada mês em cada casa (cinco casas, quatro meses, vinte folhas).

Quando uma pessoa faz uma reserva, ou resolve cancelar, ou mudar de quarto, eu marco no fichário preto, que nem um jogo elaborado de Tetris. A diferença é que é em preto e branco, e de papel e lápis. E os bloquinhos têm sentimentos, e sempre têm razão. Mas é uma satisfação pessoal muito grande ver que todo aquele investimento de tempo e de energia na minha juventude, todas aquelas horas árduas jogando Tetris, não foram em vão. É uma grande emoção.

Já o fichário azul contém os dados pessoais de cada bloquinho, nome, telefone, email, data de chegada e de partida, quarto simples ou duplo, e a assinatura deles dizendo que eles leram e concordam em respeitar as regras da casa.

Esse ano eu revolucionei o fichário azul trazendo divisórias que vão de 1 a 31, maio a agosto. Essa inovação facilita o processo de sincronia com o fichário preto: se o senhor X faz reserva para o dia 6 de julho, então eu só não tenho de ir de A a X para achar o senhor X: no momento da reserva a identidade do senhor X passa a ser "senhor 6 do 7, quarto 17", e, para todos meus processos mentais, esse é o nome do senhor X para sempre, ou ao menos até ele voltar aqui de novo.

Mas você, meu leitor perspicaz, pergunta: e se o senhor X liga antes para cancelar a reserva, como você sabe onde você arquivou a ficha dele? Resposta: para isso que existe o fichário preto de quartos. Simples, não?

Meu leitor, simpático, sugere: não seria mais fácil jogar isso tudo no computador? Um programinha simples resolveria tudo.

Percebo então que devo explicar um detalhe crucial ao meu atencioso e benévolo leitor: o charme aqui é ser "tradicional". Tradição é tudo. Nada foi mais testado e aprovado com o passar do tempo quanto o velho método lápis-e-papel que usamos (lápis autêntico, nada de lapiseira). Faxineiros, porteiros, tesoureiros, superintendentes: todos nós dependemos do sistema de comunicação face-a-face para desempenhar bem nossas funções. Nada de mediações computadorizadas, mecanizadas, automatizadas: toda oportunidade é oportunidade de praticar nossa comunicação interpessoal. Nosso sistema foi apurado com o passar das décadas talvez séculos. Tudo friamente calculado e empiricamente comprovado.

E é por isso que essa minha função necessita de uma pessoa devidamente gabaritada em contabilidade filosófica.

3.7.07

Blogversário Estérico

Hoje faz um ano. Um ano todinho. Foi num dia que nem esse que tudo começou. Só que eu estava no Brasil, e não no Canadá. E era inverninho, e não verãozão. É, agora que eu estou pensando direito, não foi um dia muito que nem hoje não. Mas que foi 3 de julho, isso foi.

Desde de então, foram 47 posts em português e 40 em inglês. O lado interplexa do blog foi honrado com 4.153 visitas, principalmente de Brasília e outras partes do Brasil, mas também de várias partes da América do Norte e do resto do mundo. Internexa, a versão do blog em inglês, recebeu no mesmo período cerca de duas mil visitas do mundo todo, do Canadá principalmente.

Para celebrar um ano de posts Estéricos (e porque hoje eu estou ocupada demais para escrever direito, mas queria escrever nem que fosse só pra constar), eis aqui três destaques do ano:

1) Mutatis Mutandi, de 11 de julho de 2006:
http://interplexa.blogspot.com/2006/07/mutatis-mutandi.html

2)Minha Terra é a Terra que é Minha, de 5 de janeiro de 2006:
http://interplexa.blogspot.com/2007/01/minha-terra-terra-que-minha.html

3) Boca de Forno, Forno, 29 de maio 2007:
http://internexa.blogspot.com/2007/05/bachelor-life.htm

O critério de seleção foi antes de tudo cronológico: minha veia de mãe coruja não me permite muito julgar a qualidade dos textos: são todos igualmente estéricos, cada um do seu jeito...

Mas você, caro leitor, que não é tão coruja, se tiver seu post estérico favorito para incluir no Vale a Pena Ver de Novo, mande seu voto.

No mais, tenha um blogversário bem Estérico, e volte sempre!

30.6.07

Atenção seletiva, ou coincidência?


É engraçado como às vezes a gente passa anos sem nunca ter pensado em determinada coisa ou pessoa, e de repente, tchum, tal coisa ou pessoa aparece em todo lugar que você olha.

Hoje eu descobri que Leonard Cohen (sobre quem eu escrevi há alguns dias (vide post "Disco Furado"), mas em quem eu nunca tinha pensado antes) morou um tempo na ilha de Hydra (que eu visitei há alguns dias (vide foto), mas cuja existência eu desconhecia até então). Eu sabia que Cohen tinha nascido em Montreal, mas não sabia que ele tinha estudado na universidade McGill (onde eu também estudei).

Hoje eu assisti um documentário sobre o Leonard Cohen, que, francamente, não foi assim o melhor documentário que eu já vi. Mas a cena em que o Bono comenta sobre a música "Hallellujah" foi de arrepiar, pelo simples fato do comentário dele ser muito semelhante a um comentário que fiz sobre a mesma música muito recentemente. (A cena em que o próprio Leonard Cohen canta "Tower of Song" com o U2 como banda de apoio também não foi nada mal.)

Eu também gostei muito da parte em que o Bono fala que o Cohen trabalha na escrita dele do jeito que um carpinteiro trabalha na mobília. Ele encara como um trabalho, tem que suar, nada de ficar esperando bater a inspiração. Talvez a inspiração bata, mas a gente tem que fazer a nossa parte.... Foi Einstein que disse que gênio é 1% inspiração e 99% transpiração?

Outra coisa que eu não sabia foi que o Cohen tinha sido ordenado monge budista. Talvez em qualquer outra fase da minha vida esse fato tivesse passado desapercebido. Mas quando eu estava na Grécia no começo do mês, eu encontrei um amigo quem eu não via há anos, e que em março desse ano foi ordenado monge budista também... As coincidências vão acumulando, que nem novela...

Talvez seja eu, pronta para achar coincidências só porque eu tenho pensado bastante nessas coisas, meio que nem a teoria de Freud sobre atenção seletiva (aquele história que é só você comprar um carro novo e de repente aparece um tanto de carro igual ao seu na rua). Não sei.

Mas é meio desconcertante quando a gente passa um tempão sem ver algo que está bem na frente do nosso nariz, e daí de repente a gente enxerga a coisa, e passa a se perguntar como é que a gente passou tanto tempo sem ver isso antes. Será que é preguiça, talvez cegueira? Ou será que a gente às vezes precisa mesmo de 99% inspiração para cada 1% de transpiração?

27.6.07

Pode acontecer em qualquer lugar

Atenção: este post contém referências a orgãos sexuais e violência (é necessário às vezes dar nome aos bois). Baseado em fatos reais.

--------------
Após um post sobre a importância de ser infantil, eis aqui um post sobre um tema mais pesado.

Ultimamente, eu tenho pensado bastante sobre o tema de violência contra mulheres, algo cuja existência eu conhecia, mas não conhecia. Até agora. Claro que eu sempre soube que é o tipo de coisa que pode acontecer a qualquer mulher, mas por alguma razão (arrogância? presunção?), num nível subconsciente eu meio que me achava imune. Não acho mais.

O texto abaixo é tradução de um email que mandei para uma amiga minha quando eu estava em Atenas no dia 7 de junho passado.

---------------
Ok. Uma coisa agradável e depois uma bem desagradável me aconteceu depois que eu te escrevi aquele email na hora do almoço.

A coisa agradável foi que eu subi o Monte Lykavittos, o ponto mais alto de Atenas, com a vista mais fantástica da cidade, da Acrópole, do mar, das ilhas. Incrivelmente lindo! O caminho até em cima me lembrou um pouco das trilhas no Mont Royal em Montreal, mas não tão bem cuidado, ou largo, ou movimentado.

Eu fui pelo caminho mais longo, mais deserto. Lá cima, tinha uma capelinha, um mirante, nem meia dúzia de turistas, um velho dormindo nos degraus de uma torre com um sino, e dois policiais. Eu dei a volta na capela, e descobri um caminho que desce para um restaurante e chega até a saída de um teleférico. Tirei umas fotos, e voltei para o topo, onde os policiais agora estavam conversando com o velho recém-acordado.

Para voltar monte abaixo, eu decidi pegar o caminho principal, que tinha mais estrutura, era mais curto, mais largo, mais movimentado. E foi aí que o algo desagradável aconteceu.

Um passante veio por trás de mim e começou a caminhar ao meu lado e a puxar assunto. Entre grego, inglês e italiano, ele se apresentou como Eric. Depois de três minutos me oferecendo cigarro, e me convidando para sentar um pouco, sem conseguir me fazer parar (eu continuei andando rápido, dizendo que tinha alguém esperando por mim e eu estava atrasada), ele simplesmente abriu a braguilha, tirou o pênis pra fora e murmurou alguma coisa tipo "fazer bambini", de pé, no meio do caminho, céu aberto, sol brilhando, plenas quatro da tarde, saída principal de uma das principais atrações turísticas de Atenas.

Eu chispei, com velocidade quadruplicada (movendo com meu centro de gravidade, meu umbigo, e todo meu ser). Ele começou a correr atrás de mim, dizendo "sorry sorry", até me alcançar e me agarrar pelo traseiro. Neste momento eu virei de uma vez (foi a primeira vez que eu parei e/ou virei), levantei o punho fechado, pus minha cara mais brava e disse algo do tipo "não se atreva!" com voz bem firme.

Para minha grande surpresa, o cara congelou. E eu de repente me toquei que eu não sabia nenhum golpe, além de levantar o punho, e como gritar por socorro provavelmente não ia ajudar muito, eu aproveitei que ele estava paralisado, girei nos meus calcanhares e corri. Em 15 segundos eu passei por outro transeunte (mas nessa altura do campeonato homens desacompanhados na faixa dos trinta anos não me transmitiam a mínima confiança). Em mais 10 segundos eu estava fora do parque, de volta à civilização. O incidente todo não levou nem 5 minutos do começo ao fim.

E agora, menos de meia hora depois, estou eu aqui te escrevendo. Minhas pernas estão quase parando de tremer, e meu coração está quase de volta ao ritmo normal. Mas eu estou pensando: eu tenho que cuidar dessa minha atitude "aventureira": isso não foi nem um pouco divertido... E policiais, só lá em cima do morro; quando você precisa mesmo, nada...

Se cuida,

Ester
*****

25.6.07

Brincar é coisa séria

Quando eu era criança, eu gostava muito de ler. Muito mesmo. Na verdade, eu lia tanto, que nem sei se eu era muito criança de fato. Eu preferia a companhia de livros do que a de outras pessoas. Eu preferia ler a brincar com gente da minha idade. Na verdade, eu gostava tanto de ler, que teve vez que a professora até chegou a chamar meus pais na escola, preocupada com minha seriedade precoce.

Por um lado, eu acho que essa seriedade toda me faz amadurecer mais rápido. Mas por outro lado, eu acho que isso também prejudicou meu desenvolvimento em outras áreas. É como se eu fosse gente grande desde pequena, e nem sempre duma maneira positiva. É possível ser imaturamente maduro, e na verdade, não é nem tão difícil.

Mês passado eu escrevi sobre "neotenia", e é algo em que tenho pensado bastante. Chame de síndrome de Peter Pan, chame do que for, mas minha opinião atual é que ser infantil é coisa muito séria. E estou me divertindo pacas tentando despertar minha criança interior (uma criança meio sisuda, mas ainda assim criança).

Quando eu era pequena, por algum motivo me veio à cabeça a convicção de que ou se é bom com livros, ou com esportes, mas não com os dois. E já que desde quando eu me entendia por gente eu já gostava de ler, eu meio que achei que minha escolha já estava feita e selada, e que seria fominha demais gostar de esportes também. Então eu entrei nesse círculo vicioso de que eu era "um desastre" em qualquer coisa que envolvesse o físico.

Acho que só foi lá pros meus 25 anos que eu saquei que essa dicotomia mente-corpo era um mito -- e um mito não só bobo como também prejudicial. Desde então eu tenho tentado reverter os efeitos de um quarto de século de vida sedentária, nem sempre com muito sucesso (embora deva confessar que é bem melhor tentar quebrar a vida sedentária agora do que esperar mais outros 25 anos).

Tudo começou com a bicicleta. Depois a dança. Depois, mexer através do umbigo. Ontem eu experimentei dar tacadas em bolas de golf pela primeira vez. E frisbee. E pulei num trampolim. E, para minha grande surpresa, não foi nenhum desastre. Muito pelo contrário.

Eis então que um círculo vicioso dá lugar a outro ciclo, não tão vicioso mas igualmente viciante. Só espero que meus livros não fiquem com muito ciúmes. E se ficarem, ah, problemas...

20.6.07

Admirando o próprio umbigo

Os gregos achavam que a Grécia era o umbigo do mundo. Se isso não é egocentrismo (literalmente), eu não sei o que é.

Dessa última vez que eu fui à Grécia eu não tive tempo de ir a Delfos, o local exato do suposto umbigo do mundo. Mas eu passei muito tempo admirando um certo umbigo. No caso, o meu próprio umbigo.

Na verdade, nos últimos dois meses eu tenho admirado meu umbigo mais do que o normal. Não que narcisismo seja algo assim tão fora do normal para mim. Mas nesses meses eu alterei minha consciência umbilical em quantidade e qualidade. Eu tenho pensado sobre meu centro de gravidade, meu eu criativo, minha fábrica de energia. Seja lá o que isso queira dizer.

7 semanas atrás eu tomei uma decisão arrojada. Eu me matriculei em três aulas sobre as quais eu não sabia nada de nada. Eu comecei a ter aula de Pilates, Tai Chi Chuan e Nia. Eu não tinha a mínima idéia do que que era essas aulas, mas eu precisava de uma motivação extra para ir para a academia, e essas eram as únicas aulas que se encaixavam no meu horário. E por coincidência, todas essas três atividades exercitam o nosso centro de gravidade. Nosso "eu" criativo. Nossa fábrica de energia. Aquela cicatrizona no meio da nossa barriga.

Acredite ou não, essas aulas estão tendo o maior impacto em outras partes do meu dia-a-dia. Tango, por exemplo. Tem mais de ano que eu estou tentando entender o que que a tia quer que eu faça quando ela fala "Gente, tem que dançar com o umbigo!". Como assim, com o umbigo? "Andar com o umbigo! Conduzir com o umbigo! Deslizar com o umbigo!" Pô, como assim? Mas agora, de repente, isso faz todo o sentido e toda a diferença! Até rodopiar ficou muito mais fácil, e muito mais legal.

Essa história de andar com o umbigo muda até o jeito que eu caminho. Andando com o umbigo eu caminho muito mais rápido, sem fazer tanto esforço. Eu geralmente me mexo a partir das minhas extremidades, e é por isso que eu ando devagar (e eu ando devagar pra caramba: é muita responsabilidade para meus pezinhos). O mesmo se dá com a quantidade de peso que eu consigo levantar (levantar peso com as mãos ou com o tronco faz toda diferença do mundo). Então agora do nada eu estou me sentindo "a forte".

Então, se você estiver procurando uma maneira mais criativa, energizante, equilibrante de admirar o próprio umbigo, experimenta esse negócio de mover a partir do seu "centro de gravidade". Sério, é o tipo de coisa que mexe o meu "eu" interior mais criativo... Seja lá o que isso queira dizer.

16.6.07

Disco furado

Quem me conhece talvez saiba da minha tendência de ouvir um disco repetidamente até furar. Às vezes é o mesmo disco por alguns dias, às vezes a semana inteira (e às vezes mais: se você duvida, ou se não me conhece, queira por gentileza conferir o post "Comida para a Alma", de abril 2007).

Nas paradas dessa semana o número único foi "The Essential Leonard Cohen". Eu comprei esse disco tem meses, junto com uns outros seis (uma dessas promoções de R$ 0,99 por disco se você comprar tantos discos, e daí você compra, e acaba sendo bem mais que um real por disco que eles usaram de isca, mas nesta altura do campeonato você já se apegou aos discos, então você termina de comprar assim mesmo).

Eu até tenho uma resolução de nunca comprar mais de dois CD´s de uma vez, justamente porque eu preciso de tempo para saborear cada disco novo, escutar até furar ou até meu cérebro se satisfazer que, sim, temos esse disco em nossos arquivos. É como se eu tivesse que gravar o disco no meu cérebro, memorizar os títulos, as ordem das faixas, as letras, para poder ter certeza que realmente eu tenho esse disco, literalmente encorporado à minha coleção, gravado no meu cérebro direito e esquerdo, ouvido direito e esquerdo, lábio superior e inferior, mãos e pernas.

Por algum motivo, apesar de toda essa minha política administrativa burocrática quanto à aquisição de Cd´s, por algum motivo eu nunca cheguei a escutar o Leonard Cohen quando eu comprei. E no meio de tantos discos me pedindo atenção, discos novos a serem gravados no cérebro, disco velho reclamando de falta de carinho, mudanças constantes de uma parte a outra da cidade, eu simplesmente nunca parei para escutar o Leo.

Até essa semana. Um outro fato que as pessoas que me conhecem podem ou não saber sobre a minha pessoa é que de quando em vez eu tenho que escutar todos os meus discos, na ordem que eles estão na prateleira. Então se dessa vez eu vou em ordem alfabética, da próxima vez eu começo com trilhas sonoras do Woody Allen e O Melhor de U2, e vou cantando até chegar no Abba. Se dessa vez é a prateleira de música brasileira, da próxima vez é música internacional. E se dessa vez for a prateleira dos Beatles (eles têm uma prateleira só para eles), da próxima vez é a do Legião (que também tem uma só para eles. Minhas prateleiras são pequeninhas). E foi assim que eu descobri o Leonard Cohen lá quietinho do lado do Phil Collins.

Então eu pus para tocar uma vez. E gostei. Pus de novo. E repeat. E coloquei para tocar até eu dormir. E depois quando eu acordei. E enquanto me vestia para o trabalho. E ao voltar do trabalho. Achei os acordes das minhas músicas favoritas na internet. Toquei "Hallellujah" no violão tantas vezes que já até dou conta de tocar sem olhar (eu sei, lugar comum dizer que a música do Leonard Cohen favorita é Hallellujah. Mas o motivo pelo qual todo mundo gosta de Hallellujah é bem simples: é uma música linda: melodicamente, ritmicamente, letralmente, guturalmente, biblicamente, absolutamente).

E os dias se passaram, e a semana se passou. Meus dedos, sem prática, de repente se sentiram como se fosse o segundo grau de novo. E minha garganta também, e meu violão, e meu coração. Eu só não me atrevi perguntar meus vizinhos o que eles acharam dessa história.

15.6.07

A Vida dos Outros

Então, eu disse que ler placas e cartazes foi uma das coisas mais divertidas que eu fiz na Grécia (meu senso nerd de diversão). O cartaz ao lado é um exemplo perfeito. Nele está escrito:

"'Oi Zôes tôn allôn"

'Oi = artigo plural

Zôes = "vidas" (tipo "zoológico")

tôn allôn = genitivo plural = "dos outros" (tipo "alopatia")
= "As Vidas dos Outros"

Captei a mensagem! E captar essa mensagem me dá aquela emoção que uma criança sente quando está aprendendo a ler.


Este cartaz é de um filme alemão que assisti recentemente, e tem semanas que eu estou ensaiando de escrever sobre ele e não escrevo. Ele é um dos filmes mais bonitos que já vi. O desenvolvimento dos personagens é absolutamente fantástico, e, no final, eu fiquei com aquela catarse que senti com "Les Miserables" de Victor Hugo, ou "A Tale of Two Cities" do Charles Dickens.

Mais especificamente, esse filme me fez pensar sobre a diferença entre justiça e misericórdia; sobre ser o dono da verdade; sobre observar - e julgar - os outros como se a gente se fosse invisível, ou acima e além de qualquer crítica.

Eu não tenho experiência com atuação, mas eu fico pensando se bons críticos são bons atores. Me parece que na vida cotidiana, os críticos mais críticos estão tão ocupados procurando defeito na atuação dos outros que não sobra tempo para atuar também (e, com todas as minhas teorias, devo confessar que também sofro desse problema). Então eles (nós?) meio que vivemos as vidas dos outros, que nem o cara do filme.

Mas chega um certo ponto, se a gente tiver sorte, que a gente cansa de escrever relatórios sobre o azedume das uvas lá do outro lado da cerca onde a grama parece ser bem mais verde (algo que não confessaríamos nunca). Quando se resolve pular para o outro lado, a gente percebe que a grama é mais verde porque ela é mais bem cuidada, e as uvas não são nem um pouco azedas quanto imaginávamos (Esopo tem uma fábula sobre a raposa e uvas azedas).

E, de repente, estamos compenetrados demais cuidando da nossa própria grama e nossas próprias uvas para ter tempo de caçar defeito na vida dos outros. Quando muito, ficamos felizes que têm outros para receber e aproveitar todas as flores e uvas que a gente não gostaria que apodrecesse no nosso jardim depois de todo esforço e cuidado que dedicamos a elas.

12.6.07

Grécia à Brasileira

Eu falei que a Grécia é o lugar no mundo que mais me lembra o Brasil, e você, cara leitora, caro leitor, deve estar se perguntando:

"Como assim? Ela diz que 'talvez seja o número de brasileiros, mas não é só isso' como se isso explicasse tudo! Mas se não é só o número de brasileiros, o que mais poderia ser?"

E eu digo: boa pergunta... boa pergunta... Com certeza, meu comentário não explica nada. Na verdade, nem sei se dá para explicar. Mas meu palpite é o seguinte:

1. Como eu disse, é só um "palpite", e palpites não seriam palpites se a gente soubesse explicar ou descrever a situação. Eu não sei o que que tem na Grécia que me lembra o Brasil: se são as pessoas, as ruas, o clima, a vegetação, a cor da terra...

Mas tanto dessa vez quanto da outra vez que eu visitei a Grécia em 2001, essa sensação de "não estar no exterior" repetiu-se constantemente, nos lugares mais diversos: partes do centro de Atenas me lembram o centro do Rio; o interior da Grécia me lembra o árido norte de Minas; algumas praias na Grécia me lembram o Nordeste do Brasil. E eu nunca tive essa sensação em outro país, e apesar da minha lista de países visitados ser restrita, ela não é tão restrita assim.

2. É bem verdade -- e igualmente notável -- que eu encontrei na Grécia mais brasileiros que o normal. Essa é outra impressão que eu tive das duas vezes que eu fui à Grécia. De novo, minha lista de países visitadas é restrita, mas nem tanto, e eu diria que eu tenho até um bom radar detector de compatriotas. Mas acho que o único outro lugar que eu já fui que eu já vi tanto brasileiro fora do Brasil foi na Flórida. Talvez... em Nova Iorque, mas muito talvez.

Se tivesse sido só dessa vez, eu atribuiria essa sensação à novela "Belíssima". Mas eu tive essa sensação também da outra vez que eu vim aqui, anos antes da "Belíssima" pensar em entrar no ar. Talvez o fator grego da novela seja conseqüência, e não causa, do número de brasileiros na Grécia.

E é só isso que eu tenho a dizer sobre esse assunto. A causa real desse fenômeno continua sem explicação. E seja fato mesmo que tem uma proporção acima da média de brasileiros na Grécia, comparado com outros lugares que eu fui, ou seja só impressão minha, é fato indisputável que eu tenho essa impressão. E nem Descartes poderia duvidar dessa minha explicação.

9.6.07

Semana à Grega

Esses últimos sete dias eu passei na Grécia, e agora fazendo o balanço da semana, as seguintes coisas me impressionaram mais:

1. A Grécia me lembra muito o Brasil. Talvez seja pelo grande número de brasileiros que encontrei aqui. Mas não é só isso.

2. Para alguém, tipo eu, que adora estudar idiomas, e que passou anos estudando grego antigo, andar tentando entender placas e propagandas, títulos de filmes e legendas, que nem uma criança aprendendo a ler, foi umas das partes mais divertidas da viagem. Tudo bem, eu admito que meu conceito de "divertido" é peculiar, e talvez um tanto nerd. Mas poucas coisas me fizeram rir tanto quanto acessar meu email, ou navegar na internet, e ver todos os comandos que eu conheço bem tudo escrito em grego, e decifrar o grego e ver que faz todo sentido (por exemplo, a palavra para "senha" é "mystikos kodikos" "código místico". Como não rir?).

3. Mas teve também diversões menos nerd. A vista do topo do monte Lykavittos, o ponto mais alto de Atenas, de onde se vê toda a cidade de Atenas, a Acrópole, o mar, algumas ilhas, tudo na frente dos seus olhos de uma vez só, é algo absolutamente de tirar o fôlego (é claro que subir o morro a pé também ajudou a tirar o fôlego). Ou sentar no monte Aerópago de noite, com a Acrópole bem acima do seu ombro, enquanto fogos de artifício passeavam no céu -- como é que eu descrevo uma coisa dessa? Caminhar na bela ilha de Hydra também não foi nada mal. E eu não vou nem começar a descrever as delícias culinárias..

4. Mas nem todas as experiências foram agradáveis. As duas coisas que me incomodaram mais foram a) a sensação de estar sendo constantemente passada para trás (e sabendo disso, mas sem poder fazer nada) e b) a facilidade de, do nada, estar numa situação de exploração sexual completamente indesejada, seja prostituição, ameaça de violência em plena luz do dia, pornografia nas bancas de revista de dia e nos canais de televisão de noite. Eu nunca me senti tão vulnerável viajando desacompanhada, e olha que tem tempo que eu viajo desacompanhada.

5. Agora que a semana está terminando, a sensação é que tem ainda um tantão de coisa para fazer e história para contar, mas minha cabeça e minhas pernas estão sobrecarregadas. É tanta coisa para absorver. Às vezes eu tenho vontade de vir passar alguns meses na Grécia, para poder visitar todos os lugares fascinantes que eu nunca tenho tempo, dinheiro, meio de transporte ou pique de visitar numa viagem curta como essa.

Mas ao mesmo tempo, a impressão que a Grécia, a antiga e a atual, nem sempre são tão bonitas e perfeitas quanto a gente sonha me faz pensar, e eu não sei se eu prefiro ficar só na fantasia, ou encarar a realidade. No final das contas, tudo que eu sei é que nada sei. Ou muito pouco.

29.5.07

Boca de forno, forno

Aprender a morar sozinho no mundo da comunicação digital é outra história. Aqui vai uma conversa minha com meu irmão final de semana passado, via msn, que até agora me faz chorar de rir.

*****

chico says:
oi, ester
chico says:
bem?
chico says:
como q liga um forno, na sua opinião?
Ester says:
forno: gira o botao para a temperatura desejada
chico says:
humm
chico says:
e aí?
Ester says:
pronto
Ester says:
deve ficar quentinho
chico says:
será q é só isso
Ester says:
o forno e' a gas?
chico says:
pq eu sinto tipo um barulho de gás
chico says:
mas aí para
chico says:
pq eu tenho q girar apertando
chico says:
mas ele não fica apertado
Ester says:
entao para, desliga tudo, abre a janela
chico says:
aí para
chico says:
não
chico says:
já parei
Ester says:
abre a janela para o gas sair
Ester says:
dai olha no piso do forno tem um buraquinho
chico says:
não, teté
chico says:
nao tá saindo gas nao
Ester says:
se o forno nao for automatico, talvez vc precisa acender com um fosforo
chico says:
acho q é automático
chico says:
pq o cara testou aqui
chico says:
e não vi ele usar fosforo
chico says:
o piorq
chico says:
guardei todos os manuais
chico says:
o unico q to precisando
chico says:
não acho
Ester says:
como voce acende a boca do fogao?
Ester says:
tem aquele raiozinho zzz?
chico says:
é só girar e o raiozinho
chico says:
q nem lá em casa
Ester says:
o forno deveria seguir o mesmo mecanismo
Ester says:
gira o negocio, e raiozinho
chico says:
mas lá em casa
chico says:
é o mesmo raiozinho
chico says:
q usa pros dois?
Ester says:
e'
Ester says:
acho que e'
chico says:
ah
chico says:
então deve ser assim
chico says:
vou tentar
chico says:
é muito chato
chico says:
vc guarda todas os trequinhos
chico says:
e na hora q precisa
chico says:
o trem some
Ester says:
:)
chico says:
falta alguma coisa
chico says:
q não to entendendo
Ester says:
nao deu certo?
chico says:
não
chico says:
mas eu não tenho nem base
chico says:
não sei exatamente
chico says:
o q q vai acontecer quando der certo
Ester says:
que que vc esta' cozinhando?
chico says:
uma pizza pre pronta
chico says:
tipo
Ester says:
ah
chico says:
aparece um foguinho
chico says:
aparece um foguinho?
chico says:
ou eu nem percebo?
chico says:
faz algum barulho?
Ester says:
nao sei.... quer tirar uma foto do forno para eu ver?
chico says:
eu to meio q fazendo um teste aqui
chico says:
deixei na temperatura indicada
chico says:
e apertei o raiozinho
chico says:
vou ver se esquenta um pouquinho
Ester says:
haha
Ester says:
hein, fan, acabei de postar no blog
chico says:
só tenho gás desde ontem
Ester says:
posso colocar essa conversa nossa no post de amanha?
chico says:
ontem fiz um miojo
chico says:
pode
Ester says:
ate' entao vc estava comendo onde?
chico says:
passei um mes tentando instalar esse gas
chico says:
é gas natural
Ester says:
legal
chico says:
chega encanado
chico says:
eu tenho tipo uma conta de gás
chico says:
só não é tao legal
chico says:
pq é a pior prestação de serviço q já tive serviço
chico says:
foi preciso
chico says:
8 visitas
Ester says:
uau
chico says:
q envolveram 3 empresas
chico says:
em um mes
chico says:
pra isso sair
chico says:
povo muito incompetente
chico says:
fiquei muito irritado
chico says:
e ainda tive q pagar 360 para parar um vazamento
Ester says:
nossa
chico says:
q não tinha como comprovar
chico says:
a veracidade
chico says:
é complicado
chico says:
pra abrir o forno
chico says:
é melhor desligar a temperatura antes né?
chico says:
tem alguma restrição
chico says:
?
Ester says:
tem nao
chico says:
ahhhhhh
chico says:
agora entendi
chico says:
não tava acontecendo não
chico says:
faltava era confiança na apertada
chico says:
rodei
chico says:
e segurei por mais tempo o raiozinho
chico says:
e fiquei olhando pro forno
chico says:
pro fundo dele
chico says:
agora o fogo pegou
chico says:
o raiozinho não estava sendo suficiente
chico says:
a minha raiva
chico says:
resolveu o problema
Ester says:
hahah
chico says:
pq apertei por mais tempo o raiozinho
chico says:
nos fins de semana
chico says:
q eu tiver empolgado
chico says:
vou tentar fazer umas receitas mais exigentes q macarrao
chico says:
tipo
chico says:
ve
chico says:
qual a real dificuldade de se fazer um arroz, feijao, farofa, molho vinagrete, ovo e bife
chico says:
aí tem um site q dá as receitas
chico says:
pra quem não sabe o obvio
chico says:
o ronaldo
chico says:
meu chefe
chico says:
me indicou
chico says:
aí vou tentar
chico says:
não deve ser tão difícil
chico says:
mas tem q ser no fim de semana
chico says:
pra ter tempo
chico says:
e pra se der muito errado
chico says:
dá tempo de comer em um outro canto
chico says:
eu to almoçando na rua
chico says:
mas vou continuar almoçando na rua
chico says:
pelo menos por enquanto
chico says:
aqui to conseguindo tomar café da manha
chico says:
e comer a noite
chico says:
com nhoque e lasanha q vai ao microondas
chico says:
e cereais
chico says:
essas coisas
chico says:
mas agora
chico says:
o miojo pode voltar com força total
chico says:
e aquelas massas
chico says:
com molhos prontos tb
chico says:
hj foi um dia cansativo
chico says:
mas rendeu

25.5.07

"Troco um cheque, mudo uma planta de lugar"

Entre as transações bancárias da semana, incluindo uma misteriosa discrepância de $15 em meu favor, uma preocupação inédita: parece que assassinei uma planta. Por negligência. Negligência não, porque preocupar eu preocupei muito. Mas nem só de preocupações vivem as plantas. Vamos aos fatos.

Fato número 1: Minha colega foi passar os próximos meses em Montreal, e deixou em meus cuidados vários items interessantes, incluindo um sofá, uma cadeira, uma máquina de café expresso e uma planta.

Fato número 2: A única planta que tive na minha vida foi um cacto que ganhei quando fiz 15 anos. O cacto morreu após alguns meses. De desidratação.

Fato número 3: Eu falei para minha colega que eu não era boa com plantas. Ela disse que era muito fácil, que eu só tinha que regar a planta uma vez por semana. Isso eu fiz. Mas a planta começou a morrer assim mesmo.

Fato número 4: Plantas são seres autótrofos. O que quer dizer que elas produzem seu próprio alimento, ao contrário de seres heterótrofos, que têm de buscar sua fonte de nutrição ingerindo outros seres vivos.

Fato número 5: A colega veio visitar final de semana passado. A máquina de expresso estava bem tratada, o sofá também, mas a planta nem tanto. Ela atribuiu ao fato de eu ter colocado a plantinha num cantinho fora do alcance de tropeções. O cantinho também era fora do alcance de luz solar, algo que eu não tinha notado antes.

Fato número 6: As plantas são autótrofas, o que não quer dizer que elas geram energia ex nihilo. Elas produzem o açúcar que necessitam através da fotossíntese. Pode-se dizer então que a comida das plantas é luz. Eu esqueci de alimentar minha planta.

Fato número 7. Nos dias que se seguiram, eu me tornei bastante atenta a luminosidade de vários lugares. Coloquei a planta perto da janela. Descobri que o sol só bate lá entre 6 e 8 da manhã. Coloquei uma lâmpada de 60watts para brilhar em cima da planta. Levei a planta para passear lá fora e pegar um solzinho. Pedi conselhos a amigos. Podei a plantinha. Levei para o escritório, onde o sol bate mais forte.

Fato número 8. Agora quase uma semana de intensos cuidados depois, a planta parece estar ressucitando, ou assim espero.

Morais da história:

1) Plantas são seres difíceis de se alimentar. Porque, como diz meu irmão citando um cantor famoso (Cartola?), plantas não choram, elas só exalam. E euxalês é um idioma que eu não domino.

2) Preocupação só não basta; saber o que fazer ajuda.

21.5.07

Neotenia

Cumprir resoluções é um treco difícil. Esse negócio de acabativa então, vou te contar, dificílimo.

Por exemplo: eu quebrei minha resolução de algumas semanas atrás de parar de ler. Essa semana eu li um livro. Todinho.

Como circunstância atenuante, vale constar que o livro não era acadêmico. Pelo contrário, embora tenha algumas coisas que definitivamente se encaixam nas minhas tarefas escolares. No meio referências mais ou menos explícitas a diferentes fluidos corporais, acompanhados de descrições mais ou menos elaboradas de como tais fluidos fluem, o autor apresenta pérolas geniais, como a seguinte:

"Neotenia" significa "permanecer jovem," e é irônico que tal palavra seja tão pouco conhecida, porque a evolução humana é dominada por ela. Os seres humanos evoluíram até seu relativo alto grau em virtude de manter as características imaturas de seus ancestrais. Os humanos são os mais avançados dos mamíferos - com exceção talvez dos golfinhos - porque eles raramente crescem. Traços comportamentais como curiosidade sobre o mundo, flexibilidade de reação, e ludicidade são características comuns a todos os jovens mamíferos, mas rapidamente se perdem com a chegada da maturidade - exceto nos humanos. A humanidade avançou, quando avançou, não por ter sido sóbria, responsável e cautelosa, mas por ter sido lúdica, rebelde e imatura.

Tom Robbins, in Still Life with the Woodpecker, p. 19, tradução de Ester Macedo.