Vozes silenciosas
No episódio passado, eu falei que o "Paideia Redux" do Timothy Reagan é uma fonte de referências excelentes. Um dos trabalhos fascinantes que esse artigo apresentou para mim foi o da estudiosa clássica Page du Bois.
Uma escritora polêmica, o refrão principal de du Bois é um convite a uma releitura dos clássicos. Mas a idéia de du Bois não é copiar as culturas antigas, colocando-as num pedestal. Muito pelo contrário, a proposta é que reconheçamos não só o quanto herdamos dos gregos antigos, mas o quanto melhoramos, e o quanto ainda temos de melhorar.
Eis alguns títulos de obras de du Bois:
- "Cavalo de Tróia: resgatando os clássicos dos conservadores" ("Trojan horses : saving the classics from conservatives")
- "Escravos e outros objetos" ("Slaves and other objects")
- "Centauros e amazonas: mulheres e a pré-história da grande corrente do ser" ("Centaurs and amazons : women and the pre-history of the great chain of being")
- "Safo está pegando fogo" ("Sappho is burning")
- "Cultivando o corpo: psicoanálise e representações antigas da mulher" ("Sowing the body : psychoanalysis and ancient representations of women")
- "Tortura e verdade" ("Torture and truth")
Dá para ver dos próprios títulos uma preocupação com a história de "cidadãos de segunda classe". Estes são grupos de pessoas como mulheres, escravos, estrangeiros e até criaturas míticas que, pelo fato de serem diferentes da classe dominante, num momento ou outro da história não eram considerados "100% ser humano".
Eu tive a oportunidade de ler os capítulos sobre Platão em "Safo está pegando fogo" e em "Cultivando o corpo", que são absolutamente excelentes. Du Bois demonstra como que, apesar de estar muito a frente do seu tempo ao apresentar um Sócrates que considerava mulheres como pessoas sábias, Platão ainda assim nega-se a dar voz para mulheres.
Aspásia, Diotima e Safo falam por meio de Sócrates, mas na verdade estão ausentes. Elas não têm voz própria. Quando aparecem nos diálogos, como Xantipe no Fédon, e as flautistas no Banquete, elas são apresentadas como simplesmente uma interrupção na "discussões sérias" dos homens, e forçadas a se retirarem.
Até a sábia Safo, que é lembrada no Fédro, é apresentada numa voz e terreno que não é o seu. Numa jogada muito criativa, du Bois imagina o que Safo diria se ela resolvesse dar o troco e escrever um poema sobre o sábio Platão.
Page du Bois é para mim uma pecinha fundamental na construção da resposta para "para que estudar os clássicos". No momento, estou esperando ansiosamente para que o seu "Cavalo de Tróia" chegue pelo correio. Eu já estou até torcendo para uma abordagem "o-mal-feito-só-pode-ser-desfeito-de-dentro-para-fora" em relação aos estudos clássicos.
Afinal, como bem aprendemos dos gregos antigos, não tem nada mais poderoso do que a força que vem de dentro.
Uma escritora polêmica, o refrão principal de du Bois é um convite a uma releitura dos clássicos. Mas a idéia de du Bois não é copiar as culturas antigas, colocando-as num pedestal. Muito pelo contrário, a proposta é que reconheçamos não só o quanto herdamos dos gregos antigos, mas o quanto melhoramos, e o quanto ainda temos de melhorar.
Eis alguns títulos de obras de du Bois:
- "Cavalo de Tróia: resgatando os clássicos dos conservadores" ("Trojan horses : saving the classics from conservatives")
- "Escravos e outros objetos" ("Slaves and other objects")
- "Centauros e amazonas: mulheres e a pré-história da grande corrente do ser" ("Centaurs and amazons : women and the pre-history of the great chain of being")
- "Safo está pegando fogo" ("Sappho is burning")
- "Cultivando o corpo: psicoanálise e representações antigas da mulher" ("Sowing the body : psychoanalysis and ancient representations of women")
- "Tortura e verdade" ("Torture and truth")
Dá para ver dos próprios títulos uma preocupação com a história de "cidadãos de segunda classe". Estes são grupos de pessoas como mulheres, escravos, estrangeiros e até criaturas míticas que, pelo fato de serem diferentes da classe dominante, num momento ou outro da história não eram considerados "100% ser humano".
Eu tive a oportunidade de ler os capítulos sobre Platão em "Safo está pegando fogo" e em "Cultivando o corpo", que são absolutamente excelentes. Du Bois demonstra como que, apesar de estar muito a frente do seu tempo ao apresentar um Sócrates que considerava mulheres como pessoas sábias, Platão ainda assim nega-se a dar voz para mulheres.
Aspásia, Diotima e Safo falam por meio de Sócrates, mas na verdade estão ausentes. Elas não têm voz própria. Quando aparecem nos diálogos, como Xantipe no Fédon, e as flautistas no Banquete, elas são apresentadas como simplesmente uma interrupção na "discussões sérias" dos homens, e forçadas a se retirarem.
Até a sábia Safo, que é lembrada no Fédro, é apresentada numa voz e terreno que não é o seu. Numa jogada muito criativa, du Bois imagina o que Safo diria se ela resolvesse dar o troco e escrever um poema sobre o sábio Platão.
Page du Bois é para mim uma pecinha fundamental na construção da resposta para "para que estudar os clássicos". No momento, estou esperando ansiosamente para que o seu "Cavalo de Tróia" chegue pelo correio. Eu já estou até torcendo para uma abordagem "o-mal-feito-só-pode-ser-desfeito-de-dentro-para-fora" em relação aos estudos clássicos.
Afinal, como bem aprendemos dos gregos antigos, não tem nada mais poderoso do que a força que vem de dentro.
5 Comments:
Estér estou muito empolgada com o seu Blog. Desde que voltamos não tenho tido muito tempo, então só consegui terminar de ler todos os textos hoje - e eu queria lê-los todos antes de comentar.
Antes de mais nada preciso dizer a coisa que primeiro me chamou a atenção: Seu texto é muito parecido com o do Chico. Engraçado que apesar da formação completamente diferente, e do pouco convívio diário, a influência do fato de ambos terem a mesma origem é fortíssima. Achei a forma, o estilo de vocês muito parecido. Talvez discordem de mim...
Agora quanto ao conteúdo do blog, que acho que é o que te interessa saber realmente. Estou achando delicioso. É claro que as vezes me perco um pouco nas referências, já que minha formação filosófica é péssima. Mas mesmo assim, o blog não é restritivo. Ao contrário, é convidativo. Quando terminamos de ler um post temos vontade de procurar os textos citados para nos informamos mais sobre o assunto. Acho que é essa mesmo a intenção, não é?
Espero ter um pouco mais de tempo pra ler alguma das suas dicas de textos e depois vir aqui comentar com vc. Mas até lá saiba que, mesmo não deixando recado, estou sempre passando por aqui.
Beijocas da Mari
Mariana,
Meu texto é parecido com o dela uma pinóia. Brincadeira, a Carla também tinha me dito isso ontem. Quando eu discordei ela ainda falou que irmão nunca acha que parece. Para mim, a comparação é só motivo de orgulho. Mas tenho que correr muito atrás do prejuízo ainda.
Agora que os Macedo entraram nesta de mundo digital não param mais. Esta coisa de blog é muito boa. Aconselho a todos que gostam de escrever sobre qualquer que seja o assunto. É um exercício e tanto.
Abraço, Chico.
Igual é a vovozinha! Na verdade, a vovozinha é a mesma mesmo, as duas. Às vezes é isso.
Pois é, Mariana, a idéia é mesmo trocar idéias e referências sobre materiais correlatos. Tipo, eu te apresento uma coisa, você me apresenta outra, outra pessoa me corrige, outra continua. Isso que eu acho fera dessa história de blog.
Beijocas,
Ester
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