Jogos de Civilizações
É comum se perguntar qual a vantagem de se estudar culturas clássicas, como Roma Antiga, ou a Grécia, or o Antigo Egito ou a China.
Tem gente que acha que é porque os povos antigos eram o máximo, e depois deles tudo entrou em declínio.
Mas essa é uma visão que esquece todos os avanços dos últimos 5, 10, 15 ou 20 séculos.
Além disso, uma opinião dessa desconsidera o fato que as civilizações não desenvolvem linearmente. Qualquer um que já jogou Civilization III sabe que, em qualquer momento do jogo, pode ser que os zulus sejam mais avançados tecnologicamente do que os gregos, apesar de terem um território menor. Da mesma maneira, os Iroquois podem ser culturalmente mais desenvolvidos que os romanos, apesar de serem mais fracos militarmente.
Dizer portanto que uma civilização, presente ou passada, é mais civilizada que outra é ver um lado só da coisa. Com isso quero dizer não só que é uma visão simplista ("civilizado em que sentido?"), mas também no sentido de ser bairrista e um tanto injusto.
Outros podem dizer que estudamos civilizações antigas por pura curiosidade, mas que tal estudo não tem relevância nenhuma. Assim sendo, tanto faz estudar Roma Antiga ou tribos Tupi-Guarani. Tudo muito interessante, mas completamente inútil para a realidade atual.
Eu também acho essa versão bairrista, embora mais no sentido cronológico do que geográfico. Uma atitude dessa desconsidera toda uma riqueza de conhecimentos que ajudam a ver por que a civilização atual é o que é, e como nossas ações podem repercurtir no futuro. É como aceitar o risco de se reinventar a roda só de preguiça ou desinteresse de pesquisar o que já foi feito.
O artigo de Timothy Reagan entitulado "Paideia Redux: A Contemporary Case for the Classics" é até agora uma das respostas mais legais que já vi para a pergunta "para que estudar os clássicos?". O autor não só defende muito bem a relevância dos clássicos nas questões atuais, mas é uma fonte excelente de referências sobre o assunto.
As ligações que Reagan faz entre teorias recentes e antigas, assim como entre outros autores da discussão contemporânea do assunto exemplificam muito bem tanto a minha própria opinião sobre a relevância dos clássicos como a minha estratégia favorita para me dar bem no jogo de Civilization.
Nós todos, tanto como civilização quanto como jogadores individuais, começamos em locais diferentes, com atribuições específicas diferentes, e acesso a diferentes recursos. Nossas especificidades são ao mesmo tempo nosso ponto forte e nossa limitação. Uma civilização com muitas montanhas, por exemplo, tem mais acesso a minérios (mais produção industrial) e mais pontos de defesa, mas tem dificuldades em locomoção e agricultura. Uma civilização com o atributo militar faz exércitos mais fortes mais rápido, mas leva mais tempo para desenvolver culturalmente.
Fazer contatos com o máximo de civilizações possível o mais cedo possível é uma estratégia em que só se tem a ganhar. Desse jeito, conseguimos multiplicar nosso acesso a recursos diversos, assim como a velocidade em que fazemos progressos tecnológicos (pois enquanto um está inventando a roda, o outro já está adiantando o expediente de inventar a escrita). A troca de recursos e informações beneficia os dois lados.
Alguém pode dizer que o objetivo do jogo não é beneficiar os adversários, mas, pelo contrário, superá-los todos. Assim sendo, só poderíamos ganhar o jogo se num momento ou outro quebrarmos nossas alianças com as outras civilizações, deixando-as para trás.
Mas isso depende de como e por que se joga o jogo. Para aqueles que, como eu, jogam Civilization repetidamente, simplesmente superar o adversário já perdeu a graça. A parte legal é tentar jogar cada vez melhor, e superar os próprios recordes de pontuação anteriores. Para fazer isso (como descobri depois de inúmeras tentativas e erros), a estratégia melhor que encontrei foi fazer o máximo de alianças possível, o mais cedo possível.
Mas tem outros jogos que a gente só tem a oportunidade de jogar uma vez. Que eu saiba, por exemplo, a vida é um deles.
Referências, alusões e recomendações:
Sid Meier´s Civilization III
Reagan, Timothy. "Paideia Redux: A Contemporary Case for the Classics." Journal of Thought 38.3 (2003): 21-39.
Burbules, Nicholas C., and Rupert Berk. "Critical Thinking and Critical Pedagogy: Relations, Differences, and Limits." Changing Terrains of Knowledge and Politics. Ed. Thomas S. Popkewitz and Lynn Fendler. New York: Routledge, 1999. 45-65.
Tem gente que acha que é porque os povos antigos eram o máximo, e depois deles tudo entrou em declínio.
Mas essa é uma visão que esquece todos os avanços dos últimos 5, 10, 15 ou 20 séculos.
Além disso, uma opinião dessa desconsidera o fato que as civilizações não desenvolvem linearmente. Qualquer um que já jogou Civilization III sabe que, em qualquer momento do jogo, pode ser que os zulus sejam mais avançados tecnologicamente do que os gregos, apesar de terem um território menor. Da mesma maneira, os Iroquois podem ser culturalmente mais desenvolvidos que os romanos, apesar de serem mais fracos militarmente.
Dizer portanto que uma civilização, presente ou passada, é mais civilizada que outra é ver um lado só da coisa. Com isso quero dizer não só que é uma visão simplista ("civilizado em que sentido?"), mas também no sentido de ser bairrista e um tanto injusto.
Outros podem dizer que estudamos civilizações antigas por pura curiosidade, mas que tal estudo não tem relevância nenhuma. Assim sendo, tanto faz estudar Roma Antiga ou tribos Tupi-Guarani. Tudo muito interessante, mas completamente inútil para a realidade atual.
Eu também acho essa versão bairrista, embora mais no sentido cronológico do que geográfico. Uma atitude dessa desconsidera toda uma riqueza de conhecimentos que ajudam a ver por que a civilização atual é o que é, e como nossas ações podem repercurtir no futuro. É como aceitar o risco de se reinventar a roda só de preguiça ou desinteresse de pesquisar o que já foi feito.
O artigo de Timothy Reagan entitulado "Paideia Redux: A Contemporary Case for the Classics" é até agora uma das respostas mais legais que já vi para a pergunta "para que estudar os clássicos?". O autor não só defende muito bem a relevância dos clássicos nas questões atuais, mas é uma fonte excelente de referências sobre o assunto.
As ligações que Reagan faz entre teorias recentes e antigas, assim como entre outros autores da discussão contemporânea do assunto exemplificam muito bem tanto a minha própria opinião sobre a relevância dos clássicos como a minha estratégia favorita para me dar bem no jogo de Civilization.
Nós todos, tanto como civilização quanto como jogadores individuais, começamos em locais diferentes, com atribuições específicas diferentes, e acesso a diferentes recursos. Nossas especificidades são ao mesmo tempo nosso ponto forte e nossa limitação. Uma civilização com muitas montanhas, por exemplo, tem mais acesso a minérios (mais produção industrial) e mais pontos de defesa, mas tem dificuldades em locomoção e agricultura. Uma civilização com o atributo militar faz exércitos mais fortes mais rápido, mas leva mais tempo para desenvolver culturalmente.
Fazer contatos com o máximo de civilizações possível o mais cedo possível é uma estratégia em que só se tem a ganhar. Desse jeito, conseguimos multiplicar nosso acesso a recursos diversos, assim como a velocidade em que fazemos progressos tecnológicos (pois enquanto um está inventando a roda, o outro já está adiantando o expediente de inventar a escrita). A troca de recursos e informações beneficia os dois lados.
Alguém pode dizer que o objetivo do jogo não é beneficiar os adversários, mas, pelo contrário, superá-los todos. Assim sendo, só poderíamos ganhar o jogo se num momento ou outro quebrarmos nossas alianças com as outras civilizações, deixando-as para trás.
Mas isso depende de como e por que se joga o jogo. Para aqueles que, como eu, jogam Civilization repetidamente, simplesmente superar o adversário já perdeu a graça. A parte legal é tentar jogar cada vez melhor, e superar os próprios recordes de pontuação anteriores. Para fazer isso (como descobri depois de inúmeras tentativas e erros), a estratégia melhor que encontrei foi fazer o máximo de alianças possível, o mais cedo possível.
Mas tem outros jogos que a gente só tem a oportunidade de jogar uma vez. Que eu saiba, por exemplo, a vida é um deles.
Referências, alusões e recomendações:
Sid Meier´s Civilization III
Reagan, Timothy. "Paideia Redux: A Contemporary Case for the Classics." Journal of Thought 38.3 (2003): 21-39.
Burbules, Nicholas C., and Rupert Berk. "Critical Thinking and Critical Pedagogy: Relations, Differences, and Limits." Changing Terrains of Knowledge and Politics. Ed. Thomas S. Popkewitz and Lynn Fendler. New York: Routledge, 1999. 45-65.
5 Comments:
Muito bom! gostei da referência à origem montalvanense. Aliás, o berço da civilização, segundo Antônio Montalvão, é Montalvânia.
Bairrismos à parte, suspeito que comentário de tão bom gosto só possa ter sido feito por algum dos meus pais. :oD
Este comentário foi removido por um administrador do blog.
Não entendi a comparação com 'Civilization'. Aliás, não entendi qual é o argumento do Timothy Reagan. What am I missing?
No seu paralelo, você parece dizer que a troca de informações beneficia as duas partes. Deixando o 'Civilization' de lado, no qual você sempre foi melhor do que eu, me diga o seguinte: o que um físico hoje ganha ao ler a 'Física' de Aristóteles? Ou um médico, ao ler o Corpus Hippocraticum?
Quero dizer, defender os clássicos é defender que eles ainda têm algo a nos ensinar, e não ficou claro por que você ou o Reagan acham isso, ou de que modo a comparação com 'Civilization' responde a isso.
Isso, obviamente, não é uma crítica aos clássicos - é só um pedido de esclarecimentos: por que ler os clássicos?
LM
Olá Bela Dama ,
Quero saber mais sobre o jogo Civilization ....é um jogo informatizado ? ou é um jogo de tabuleiro ?
Beijos,
Angus
Postar um comentário
<< Home